sexta-feira, 23 de dezembro de 2016

Complementando Schopenhauer

Complementando Schopenhauer

Complementando Schopenhauer

“O Budismo é a religião mais elevada e a sua doutrina ética é ortodoxa em toda a Ásia, excepto onde prevalece a detestável doutrina do Islão.” – Arthur Schopenhauer

O Pessimismo

Ao contrário da maioria dos filósofos do seu tempo (exceptuando Kierkegaard) Schopenhauer foi um filósofo pessimista. Tanto os pessimistas como os optimistas, e exceptuando Fichte, tiveram o problema de tentar interpretar a Vida à luz da Razão disponível; Fichte foi o único no seu tempo que defendeu a ideia de que o saber humano era limitado e em evolução em direcção ao Saber Absoluto.

“Cientificamente, tanto o pessimismo como o optimismo são refutáveis; o optimismo tenta provar que o universo existe para nos agradar, e o pessimismo que ele existe para nos desagradar. Nenhum pode demonstrar-se.” – Bertrand Russell, filósofo racionalista e ateu

Contudo, a refutabilidade por parte da ciência em relação ao pessimismo e ao optimismo não é dialéctica. Seguindo o raciocínio do “ateu” e “racionalista” Bertrand Russell, perante a refutação, por parte da ciência, do pessimismo e do optimismo, ficamos sem saber qual o valor dialéctico escolhido. Quando refutamos alguma coisa sem elegermos outra, ou se elegemos o Nada (ausência de valor) como valor dialéctico, somos pessimistas. O pessimismo é, por inerência, a negação da dialéctica Hegeliana, e Russell admitiu assim o pessimismo da ciência. A alternativa de Russell seria invocar o “nexo dos distintos” de Croce (complementarei Benedetto Croce, um dia destes) em contraponto à “dialéctica dos opostos” de Hegel. Porém, o reconhecimento de uma hierarquia de valores crociana na Razão levaria Russell a reconhecer a existência de uma Supra-razão, uma Razão que transcende o Homem (racionalismo absoluto de Hegel), coisa que Russell sempre recusou. O problema dos ateus é que caem constantemente nas suas próprias armadilhas retóricas, e a vantagem dos teístas é que encontram sempre uma justificação para os fenómenos, mesmo que essas justificações não sejam (ainda) cientificamente comprovadas.
Ao contrário de Russell, eu penso que a verdadeira ciência é optimista, porque parte do princípio que o universo existe para fazer feliz o Homem e procura constantemente a chave dessa felicidade.

A herança de Kant

Arthur Schopenhauer nasceu a 22 de Fevereiro de 1788 em Dantzig, então cidade-estado desavinda da Prússia, hoje cidade da Polónia (Gdansk), filho de pai rico e de mãe intelectual, e morreu em 1860. Schopenhauer frequentou a universidade de Gottingen. Na sua filosofia, declarou-se influenciado por Kant — que considerou o filósofo mais importante de toda a história do pensamento —, por Platão e por Upanishads, mas penso que de Platão não terá tido grande influência nele, mas antes a filosofia da idade helenística.

Schopenhauer desprezou Hegel, criticou Schelling, tolerou Fichte — que considerou ter talento, mas mal usado —, mas foi em Kant que baseou a sua filosofia. Kant faz a distinção entre “fenómeno”e “noumeno”, sendo o “fenómeno” a natureza, e o “noumeno” a “substância transcendental”, a “coisa-em-si”, e foi a partir deste princípio de Kant que Schopenhauer desenvolve a sua teoria. Enquanto que Fichte e Hegel transformaram o “noumeno” kantiano num dado metafísico, Schopenhauer identificou o noumeno com a Vontade (por isso é que é essencial compreender Kant e a sua “Crítica da Razão Pura”; sem ele, uma data de filósofos não fazem sentido, incluindo Fichte, Hegel e até Marx).
Para Kant, o “fenómeno” é a realidade cujo conhecimento limitado está acessível ao ser humano, e o “noumeno” é o limite desse conhecimento. Para Schopenhauer, o “fenómeno” é a aparência e a ilusão daquilo a que chamamos de “realidade”, e o “noumeno” é a verdadeira realidade que se esconde por detrás da aparência e da ilusão. Schopenhauer altera os conceitos de “fenómeno” e de “noumeno” de Kant, por influência claríssima da filosofia budista.

Por exemplo, seguindo o pensamento de Schopenhauer, o que na nossa percepção (fenómeno) aparece como sendo o nosso corpo, é a nossa vontade (noumeno).
Sob o ponto de vista budista, esta constatação é verdadeira, porque o budismo remete o conceito de Vontade para a vontade espiritual no ciclo de reincarnações. Para o budismo, independentemente da nossa herança genética, que é uma realidade inquestionável, existe a vontade espiritual que molda em grande percentagem o ser humano. Uma pessoa é o que é, não só por influência genética, cultural, biológica, empírica, e até por influência astrológica, mas essencialmente pela vontade do espírito em ser o que é em cada vida vivida no Espaço-tempo, através das reincarnações que determinam os diferentes estádios da evolução espiritual. Foi a Upanishads e ao budismo que Schopenhauer foi buscar a sua teoria, condimentando-a com Kant para a racionalizar, embora não pudesse ir muito longe na influência budista do seu pensamento, devido ao racionalismo dogmático europeu que o consideraria, de imediato, como lunático.

Kant defendeu a ideia de que o estudo da lei moral pode levar-nos para além dos “fenómenos” (“fenómenos” de Kant = realidade natural) e dar-nos o conhecimento que a percepção sensível não nos pode dar, e afirmou que a lei moral diz respeito essencialmente à vontade. Russell diz-nos que a lei moral resulta do “desejo” individual. Para Schopenhauer, a Vontade a que a lei moral diz respeito não é o “desejo” Russeliano, mas a Vontade segundo a concepção budista, que para além do “fenómeno” envolve o “noumeno”. Russell limita a lei moral ao simples “desejo” do ser humano, “desejo” como expressão individual material, despojado de qualquer influência metafísica. Para Kant, a diferença entre um homem bom e um homem mau está na diferença do mundo das “coisas-em-si” (noumeno) dos dois homens, e portanto, na diferença da vontade que reflecte a diferença do mundo das “coisas-em-si” nos dois homens.

O racionalismo dogmático ocidental produz caricaturas, porque em vez de Kant dizer que a “coisa-em-si” ou que a “subjectividade transcendental” é a “essência espiritual”, chama-lhe outros nomes para fugir à “perseguição” ideológica dos materialistas e dos racionalistas dogmáticos. Exagerando um pouco, e para que se compreenda o que quero dizer: à semelhança do que acontecia com os escritores e jornalistas no tempo da PIDE, os filósofos iluministas, sejam os do século 19 como os contemporâneos, têm que falar por códigos, sinónimos, paráfrases e conceitos mais ou menos abstractos, para escapar à censura ideológica do racionalismo dogmático intelectual, “científico” e politicamente correcto. Se Kant tivesse falado em “essência espiritual” em vez de “coisa-em-si”, seria porventura um filósofo esquecido pela História. Graças à dissimulação ideológica de Kant em plena Era de afirmação do racionalismo cartesiano, o “idealismo” pode desenvolver-se; por isso, Kant terá sido o filósofo europeu mais sagaz e inteligente.

A Vontade

Mas voltemos a Schopenhauer. Para evitar a todo o custo referir-se à Vontade implícita no princípio da reincarnação budista, Schopenhauer limitou-se a falar na Vontade Universal. Quando falei de Fichte, referi um princípio comum a várias religiões: o “princípio Potencial” do Absoluto (deídade), que caracteriza a capacidade da Vontade do Absoluto em si próprio e com propósito em si.
Schopenhauer atém-se ao “princípio Potencial” do Absoluto, à capacidade volitiva infinita, e por isso, una e indivisível e independente de toda a individuação. Sendo que a “subjectividade transcendental” kantiana (a essência espiritual) é, segundo Fichte e Schopenhauer, decorrente da consubstancialidade do Homem com o Absoluto, a Vontade Infinita existe no Homem como em qualquer outro ser da natureza. Note-se que o budismo considera que todos os seres vivos, racionais e irracionais, têm espírito (não confundir “espírito” com “alma”) ou a “centelha do Absoluto”. Naturalmente que a visão de Schopenhauer sobre a Vontade Infinita reflecte a filosofia budista.

Se para Hegel “o que é real é racional”, isto é, a realidade (o “fenómeno”) é Razão, para Schopenhauer a realidade é Vontade irracional, sendo que “irracional” se deve entender como algo que está para além da compreensão humana. O optimista Hegel justifica racionalmente tudo aquilo “que é”, que existe na natureza; o pessimista Schopenhauer pretende negar tudo o “que é”, porque tudo o “que é” é aparência, ilusão e resultado da Vontade Absoluta que o Homem não compreende.

Complementando: eu penso que Hegel e Schopenhauer tinham ambos razão: a) a natureza é racional (Hegel) porque faz parte da Razão Universal, b) a natureza é criada e, por isso, finita, sendo uma “sombra”, uma aparência, uma ilusão, um Ersatz à imagem do Absoluto (Schopenhauer), não deixando por isso de ser racional, c) a Razão é um valor infinito (segundo o conceito de “Saber Absoluto” de Fichte) que está presente na realidade finita (Schopenhauer e Hegel), d) a capacidade volitiva do Absoluto está presente em todas as manifestações do Finito (o conceito budista da “Vontade” de Schopenhauer). Na minha opinião, o Finito e Infinito são ambos reais, e na medida em que o Finito é criado a partir do Infinito, a Razão do Finito advém da Razão infinita.

A Individualidade

Tanto Hegel como Schopenhauer consideram que a individualidade do ser humano tem pouca importância, em Hegel por causa do anseio pelo Infinito, em Schopenhauer por causa da individualidade como sendo uma aparência e uma ilusão.

A Vontade do Homem, sendo parte da “coisa-em-si” e não do Espaço-tempo, e sendo por isso – segundo Schopenhauer – real, não só não pode ser datada de acordo com critérios do Espaço-tempo, como não pode ser composta de actos de vontade separados, porque o tempo e o espaço são fonte da pluralidade que preside ao “princípio da individuação” – segundo a escolástica, o princípio segundo o qual um ser humano (ou outro ser vivo) se singulariza numa realidade única; por exemplo: Orlando Braga.
Aqui, há que ter em atenção a distinção budista entre “espírito” e “alma”. De facto, segundo o budismo que Schopenhauer estudou, o “espírito” (“coisa-em-si”) está livre do “princípio da individuação” e da separação de actos de Vontade inerente ao Espaço-tempo, mas a “alma” é a intermediária entre o Espaço-tempo e o “noumeno” espiritual, entre o Finito e o Infinito – é a “alma” que permite que o “noumeno” se sujeite, indirectamente, ao “princípio da individuação” no Espaço-tempo. Segundo o budismo, a “alma” pode ser datada e sujeita-se ao critério da pluralidade do Espaço-tempo durante o seu ciclo de reencarnações, e Schopenhauer sabia dessa teoria budista. Quando ele se refere à realidade intemporal e inespacial da “coisa-em-si”, refere-se ao espírito, e não à alma.
Para Schopenhauer, o melhor dos mitos é o nirvana budista, que para ele significa “extinção”. Contudo, sabemos que o Nirvana budista é a “União com o Todo”, a ausência de individualidade que essa união implica, e não no sentido de “extinção” que Schopenhauer lhe dá.
Schopenhauer fugiu da teoria da reencarnação budista como o diabo da cruz. Segundo Schopenhauer, a teoria budista da reincarnação, não sendo totalmente verdadeira, diz a verdade em forma de mito. Não sei se Schopenhauer não entendeu o budismo, se não o aceitou completamente, ou se o analisou do alto da sua cátedra racionalista – embora tivesse uma estátua de Buda no seu escritório.

Liberdade e libertação

A liberdade, em Hegel, está estritamente ligada à necessidade dialéctica – herdada de Aristóteles, transformada por Kant, e optimizada por Hegel, que segundo este último, o falso se torna em algo de positivo, sendo o falso um momento necessário ao verdadeiro: a restrição da liberdade (negativo) é necessária à própria liberdade (positivo). Para Schopenhauer, não existe liberdade, porque o ser humano está sujeito ao determinismo do mundo dos fenómenos.
Aqui, temos que saber se a “liberdade” era para Hegel o mesmo que para Schopenhauer. Hegel considera que a liberdade condicionada pelo Espaço-tempo não deixa de ser liberdade; Schopenhauer acha que tudo que não seja a liberdade total não é liberdade. Continuo a pensar que ambos têm razão.

Para Schopenhauer, a “vontade cósmica” não corresponde à “vontade divina” de Espinosa. Para este, a virtude estaria em consonância com a vontade divina: para Schopenhauer, a vontade cósmica é perversa, está internamente dividida e é discordante e devoradora de si própria – talvez porque para Schopenhauer o bem e o mal tenham origem na Vontade cósmica, porque para Schopenhauer não fazia sentido separar o bem e o mal da mesma fonte de Vontade. O que fazia sentido para Schopenhauer era a libertação do Homem em relação a essa Vontade.
Na minha opinião, contudo, assim como a antimatéria é a ausência de matéria, a escuridão absoluta é total ausência de luz – o mal absoluto é a total ausência do bem; nesta perspectiva, concordo mais com panteísmo de Espinosa do que com Schopenhauer, que não sendo ateu, também não era um panteísta; o mundo do panteísmo é um mundo de optimismo, exactamente onde o mundo de Schopenhauer existe unicamente para o negar.
A teoria de Schopenhauer é fruto de uma tentativa de racionalização do budismo; em resultado desta racionalização, Schopenhauer pretende quebrar os laços da vontade individual – não para atingir a harmonia com Deus, procurando um qualquer bem positivo, mas com um propósito inteiramente negativo resultante da tentativa de racionalização dos princípios da filosofia religiosa budista.

Sendo que para Schopenhauer a Vontade cósmica é perversa, é a fonte infindável de todo o sofrimento do ser humano, é também a essência da vida humana e aumenta com o conhecimento: quanto mais conhecimento tem o Homem, mais sofre a perversão da Vontade cósmica. A Vontade cósmica não tem como fim a felicidade, porque não define este fim ou qualquer outro, e embora a morte seja o termo do sofrimento, perseguimos os nossos fins fúteis. A felicidade não existe porque sentimos pena de um desejo não realizado, mas realizando-o, sentimos saciedade e fastio. Segundo Schopenhauer, o instinto humano incita à procriação que provoca mais sofrimento e morte, e por isso há o pudor do acto sexual.

Para Schopenhauer, o mundo dos fenómenos (a aparência, a ilusão) é sinónimo de sofrimento e dor; por isso, ele recomenda o ascetismo – a luta contra os impulsos discordantes da Vontade – como forma de libertação. A injustiça é a condição da Vontade em viver dividida e discordante, através dos diversos indivíduos. O homem mau não é apenas o que faz mal aos outros, é também aquele que vive constantemente atormentado pelo mal que lhe fizeram (aqui, a influência budista é clara). A resignação, a pobreza, o sacrifício e o ascetismo em geral têm o mesmo objectivo: libertar-nos dos grilhões da Vontade de viver, extingui-los e anulá-los (budismo, outra vez). A supressão da vontade de viver é o único e verdadeiro acto de liberdade que é possível ao Homem assumir, mas o suicídio é inútil, porque não é uma manifestação da negação da vontade, mas uma enérgica afirmação da mesma – aqui, mais uma vez a influência do budismo. O suicida quer a vida, estando só descontente com aquela vida que lhe coube em sorte; destruindo seu corpo, não destrói a vontade de viver, que não sofre minimamente com o seu gesto. Para que a vontade de viver fosse destruída em toda a Humanidade, bastaria que um único indivíduo conseguisse destruir a sua vontade de viver (sem suicídio), porque a vontade de viver é uma só e comum a todos.

Contudo, o próprio Schopenhauer esteve longe de uma vida ascética que recomendou na sua filosofia, e explica porquê:

“Que o santo seja um filósofo é tão pouco importante, como pouco importante é que o filósofo seja um santo. (…) Representar abstractamente, universalmente, limpidamente, em conceitos a essência do mundo, e deste modo, qualquer imagem reflexa, colocá-la nos permanentes e sempre proporcionados conceitos da Razão: isto sim é a filosofia e não outra coisa.” – Schopenhauer (“Welt”)

Dou um conselho a quem se interesse por Schopenhauer: leia antes alguma coisa sobre o budismo; tem a mesma essência e, ao menos, dá-nos a “Possibilidade” que Kierkegaard definiu como sendo a maior necessidade do Homem.
De resto, Schopenhauer foi totalmente incoerente com a sua filosofia: mulherengo, nunca assumiu um casamento; jantava bem nos melhores restaurantes, não dava esmolas por uma questão de princípio, era muito conflituoso e extremamente egoísta.
Uma vez, Schopenhauer irritou-se com uma velha costureira que estava a falar com um amigo à porta do seu apartamento; atirou-a pela escada abaixo, e a velha ficou inválida. O tribunal condenou Schopenhauer a pagar uma pensão vitalícia à costureira, e quando esta morreu, Schopenhauer escrevinhou no seu livro de contas: “Obit anus, abit onus” (“morta a velha, finda a carga”).

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December 23, 2016 at 09:15AM
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domingo, 4 de dezembro de 2016

Mec��nica Qu��ntica

Mec��nica Qu��ntica

Ago07

Mecânica Quântica

Em finais do século XIX, muitos eram os físicos que pensavam que o “trabalho” deles estava a chegar ao fim, pois a maioria dos fenómenos físicos observados eram compreendidos através de leis bem definidas. Faltava apenas um ou outro ponto que tinha que ser limado, para que a Física ficasse completa, ou seja, usando as leis desta conseguir-se-ia prever o comportamento de qualquer sistema. (Diz-se que um aluno teria perguntado a Lord Kelvin o que estudar em Física, e este aconselhou-o a mudar de área, pois esta estava quase “arrumada”.)

Felizmente estavam a ser demasiado optimistas. Esses “pequenos pontos por laminar” vieram trazer à luz toda uma Física revolucionária que nos mostrava o quanto ainda estávamos longe de ter compreendido tudo. Surge então no princípio do século XX duas grandes novas teorias a explorar os limites das escalas conhecidas: a escala do muito grande pela Relatividade e a escala do muito pequeno pela Mecânica Quântica.

Um dos problemas sem solução nos finais do século XIX era o problema do corpo negro (que não irei detalhar aqui). Planck resolveu este problema introduzindo um conceito completamente novo em Física: a energia envolvida neste problema estava quantificada. Ainda assim, não foi Planck que descobriu que este “comportamento da energia” acontecia do mesmo modo com a luz (embora seja afirmado isso em muita literatura), tal apenas foi descoberto por Albert Einstein, como referi no artigo do Efeito Fotoeléctrico.

O efeito fotoeléctrico mais o efeito Compton vieram assegurar que a luz se comportava como partícula, o que implicava que a luz tinha um comportamento dual, pois os fenómenos ondulatórios desta também já eram conhecidos. (Mais sobre o assunto no post do Carácter Dual da Luz e Matéria.)

Este é um dos primeiros resultados quânticos – perceber que tudo o que conhecemos que é constituído por partículas, se pode comportar como uma onda. Como compreender isto? Bem, é contra a nossa intuição, mas devemos notar que a nossa intuição apenas assimila até uma dada escala – fenómenos quânticos não fazem parte desta escala, portanto não podemos esperar que o que pensamos ser lógico se aplique neste novo mundo. Fazendo os cálculos constata-se facilmente que a uma escala “normal” para nós não faz sentido pensar numa qualquer “coisa” segundo a sua onda, no entanto, na escala dos átomos isto já não é verdade, a função de onda (expressão matemática que descreve completamente a onda de matéria) tem que ser tida em conta para descrever quer a posição, quer qualquer outra grandeza física referente à partícula.

De considerações puramente matemáticas, Heisenberg deduziu que o facto de as propriedades físicas de uma partícula serem descritas através de uma função de onda, implica necessariamente que estas grandezas estejam agrupadas duas a duas, de tal modo que a sua precisão esteja limitada nessas “intersecções”! O exemplo trivial destes pares é o caso da posição e o momento linear (produto da massa com o vector velocidade):

‘x’ refere-se à posição de uma partícula e ‘p’ ao seu respectivo momento linear. Assim, o produto entre as incertezas de cada um tem que ser maior que a constante representada (h é a constante de Planck), ou seja, a incerteza não pode ser nula, pois desse modo a condição apresentada seria impossível, por outro lado, se se pretender diminuir a incerteza de uma das grandezas, a da outra irá necessariamente aumentar! Por outras palavras: é impossível medir a posição e a velocidade de uma dada partícula num dado instante, sem que haja uma imprecisão associada a essa medida (não interessa o quão rigoroso seja o instrumento de medida).

Einstein não gostava deste princípio, talvez por ele representar uma grande limitação para a Física, portanto, propôs uma experiência (genial) para contrariar o Princípio da Incerteza:

Poder-se-ia fazer um sistema de duas partículas exactamente simétricas, quer em posição, quer em velocidade em relação a um dado referencial (com massas iguais); assim se medíssemos a posição de uma partícula, saberíamos exactamente a posição da outra por questões de simetria, e de igual modo para a velocidade. Deste modo, o Princípio seria vencido, pois poderíamos determinar com precisão infinita tanto a posição quanto o momento linear, usando apenas o auxílio de uma partícula suplementar (ou seja, media-se uma grandeza numa das partículas, e a outra grandeza na outra partícula – supostamente as imprecisões deveriam ser independentes). Incrivelmente o Princípio de Heisenberg sobreviveu a esta experiência: ao se medir a posição de uma das partículas, o momento linear não era apenas alterado nessa partícula, mas também na sua simétrica!! Este é de resto o princípio que está por de trás do teletransporte quântico – notar que o transporte deste tipo de “informação” não se faz à velocidade da luz, mas sim instantaneamente! (Na verdade não é considerada informação, devido a pormenores que podem ficar para outro artigo. Caso fosse informação, a teoria da Relatividade era violada, o que não é o caso.)

Numa outra linha de investigação, Schrodinger desenvolveu a equação que ficou conhecida pelo seu nome – Equação de Schrodinger:

Em que:

  •  – constante de Planck;
  •  – massa da partícula;
  •  – função de onda;
  •  – energia potencial;
  •  – energia total;
  •  – vector posição;
  • – laplaciano, ou seja, a segunda derivada na posição.

Embora a função de onda descreva em si todo o sistema, a verdade é que a função em si não tem qualquer significado físico. No entanto, determinou-se que o seu quadrado (multiplicação por si própria) define a probabilidade de encontrar a partícula em questão numa dada posição.

Quem for mais dado à matemática poderá compreender que implicações bastante interessantes advêm destes factos.

Deixando, no entanto, a matemática um pouco de lado, resolvendo a equação de Schrodinger surge mais uma solução que contradiz todo o senso comum: tomando o exemplo de uma partícula com uma dada energia E, que tenta ultrapassar uma barreira de energia (potencial) V, seria de esperar que se V>E, a partícula não poderia passar (fazendo o paralelo com o mundo “real”, imaginem que disparam um tiro contra uma parede: a bala só irá atravessar a parede se tiver energia suficiente para a atravessar), no entanto, no mundo quântico isso não é verdade, existe realmente uma probabilidade não nula de haver passagem (este é o fenómeno que está na base do funcionamento dos microscópios electrónicos de varrimento, por exemplo). Este é o chamado efeito de túnel. Reparem, se vivessem num mundo quântico, atravessar uma parede ou mandar-lhe uma cabeçada, seria meramente uma questão de probabilidades!

As implicações desta nova conceptualização do mundo teve consequências profundas na nossa forma de encarar o universo: nem sempre tudo é como parece ser; com mudança de escala, o senso comum pode não ser aplicável!

A nanotecnologia (tecnologia à escala nanométrica – um milhão de vezes inferior ao milímetro) ainda é uma área de investigação jovem, não obstante, grandes inventos já foram produzidos e muitos mais deverão surgir nos próximos anos.

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December 04, 2016 at 02:04PM
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O Mundo das Part��culas ��� Parte I

O Mundo das Part��culas ��� Parte I

Ago28

O Mundo das Partículas – Parte I

atom

Talvez alguns de vós já se tenham deparado com “nomes” para partículas que não fazem a mínima ideia do que querem dizer, apenas sabem que deve ser algo pequeno, algo que só os cientistas compreendem, algo que parece ter tanto de real, quanto as histórias do tio patinhas.

Neste artigo irei tentar referir a maioria dos nomes que aparecem nesse complicado mundo, que apesar de na sua maioria ainda nos estar vendado, com o progresso da tecnologia vamos progressivamente explorando e conquistando. Serei sempre breve, para que o artigo não fique demasiado grande e enfadonho, ainda assim, irei fazendo ocasionalmente algumas observações pessoais. Caso não fiquem satisfeitos com alguma explicação, poderão pedir nos comentários para eu detalhar mais algum assunto.

O Átomo

Quando partimos em bocados um certo pedaço de um dado material, podemos questionar-nos: será que cada bocado é igualmente passível de ser quebrado em bocados mais pequenos? Será que estes bocados mantêm as mesmas propriedades físicas que o pedaço maior? Será que se pode repetir indefinidamente este processo de partir sempre em bocados de menores dimensões?

Em resposta à última pergunta, Demócrito, IV a.c., postulou a existência de uma unidade básica na matéria que não poderia ser fragmentada – o átomo (significa indivisível). Toda a matéria seria constituída por um dado conjunto de átomos, os quais poderiam apenas diferir em tamanho, forma e massa. Esta noção veio acabar com a aprazível ideia de que a matéria era constituída pelos quatro elementos da natureza: água, terra, ar e fogo.

Na verdade, a única parte que parece estar errada nesta ideia de átomo (à luz do que se sabe hoje), é que essas partículas indivisíveis diferem na verdade em muitos outros aspectos, contudo a ideia de partículas indivisíveis permaneceu até hoje, ainda que muitas das partículas indivisíveis do passado, já o não sejam actualmente. De um ponto de vista meramente filosófico, é uma pena que o conceito de átomo tenha ficado ligado aos elementos químicos, que serão referidos mais adiante, o que leva a parecer que Demócrito estava definitivamente errado, quando na verdade quem esteve errado foi o sujeito que mais tarde decidiu que o conceito de átomo iria ficar conotado com elemento químico e não com as partículas que constituíam esse átomo.

Foi preciso esperar mais de 2000 anos para que o conceito de átomo começasse a evoluir, deixando a esfera da Filosofia, para se tornar um conceito fundamental na Física. Dalton, no século XIX, volta a afirmar que toda a matéria é constituída por átomos, contudo, desta vez já são invocados alguns conceitos da Química – como seja a indestrutibilidade dos átomos, ou as reacções entre átomos (devido ao contributo de Lavoisier e outros).

Basta lembrar-nos da bomba atómica, para que logo nos apercebamos que a maioria das inovações impostas por Dalton na teoria atómica são incorrectas. Mas é bom compreender que eram erros necessários – na Ciência levantam-se hipóteses, testam-se e conclui-se. A conclusão poderá ser o simples rejeitar das hipóteses – não se trata de perda de tempo, mas sim de um mal necessário. Para se encontrar o caminho num labirinto é preciso percorrer caminhos errados para determinar qual o correcto.

Não me vou preocupar em explicar como evoluíram os modelos atómicos, apenas me vou restringir às partículas: pouco depois de Dalton ter proposto o seu modelo, Faraday descobriu que os fenómenos da electricidade faziam presumir a existência de uma nova partícula:

O Electrão

Mas só Thomson é que confirmou realmente a existência desta nova partícula. Esta era a partícula que fazia conduzir a electricidade, uma partícula com carga, uma partícula que veio-se a descobrir (Thomson também), estava presente em qualquer átomo. E eis que o “átomo” deixa de o ser…

E agora, se pensarmos um pouco: se o átomo é algo sem carga, e o electrão que faz parte do átomo tem carga negativa (convenção), é evidente que tem que lá estar alguma coisa para equilibrar a carga:

O Protão

Esta outra carga do átomo tem a particularidade de ser quase 2000 vezes mais pesada que a outra carga, este facto, aliado ao Electromagnetismo que postula a existência de uma força eléctrica com uma relação bastante semelhante à força gravítica (exceptuando o valor da constante, bem como o facto de haver repulsão eléctrica), vem dizer-nos que do mesmo modo que a Lua orbita a Terra, por a Terra ser muito mais pesada, do mesmo modo o electrão deve orbitar o protão, por este ser muito mais pesado.

Ainda que esta visualização não seja estritamente correcta (tendo em conta a Mecânica Quântica), permitiu a criação do Modelo Planetário do Átomo, que providenciou a explicação de muitos fenómenos físicos.

A história do átomo poderia parecer completa, mas 40 anos depois do protão, foi a vez de surgir:

O Neutrão

Foi descoberto por James Chadwick, e trata-se de uma partícula sem carga (daí ter demorado tanto tempo a ser detectada), contudo a sua presença no átomo é essencial para a estabilidade deste! A massa desta partícula é quase igual à do protão, e por isso o seu movimento está tão limitado quanto este. Assim, estas duas partículas (ou conjuntos delas) formam aquilo a que se chama o núcleo do átomo, sendo circundados por electrões.

Daqui para a frente, começam a surgir as implicações inevitáveis da Mecânica Quântica. Para não me alongar em demasia, vou restringir-me aos “factos”.

O Fotão

Com as contribuições de Planck e Einstein, a luz passa a ser definitivamente entendida como sendo um conjunto de partículas, mas também como uma onda – Carácter Dual da Luz e da Matéria.

Estas partículas são energia no “estado puro”, uma vez que não têm massa.

Os fotões não são apenas complexos na sua divergência em relação ao que estamos “habituados” a pensar como sendo partículas, na verdade divergem em algo bastante mais fundamental em relação a todas as partículas antes enunciadas. Os fotões são bosões, enquanto que os electrões, protões e neutrões são fermiões.

O Bosão

Os bosões são partículas de spin* inteiro e que por isso obedecem à estatística de Bose-Einstein. Ficaram na mesma? Nova tentativa: são partículas indistinguíveis, que não obedecem ao Princípio da Exclusão de Pauli. Este princípio afirma que não pode haver duas partículas descritas pela mesma função de onda. Na mesma? Se tivermos um sistema com vários níveis de energia (imaginem uma escada, em que as partículas que conseguem subir mais degraus são as mais energéticas), este princípio afirma que não podem haver duas partículas no mesmo degrau! Uma vez que existe o Princípio da Energia Mínima, as partículas irão distribuir-se pelos degraus de modo a que o todo corresponda à menor configuração de energia possível (no caso da escada seria simples: iria cada partícula ocupar o degrau mais baixo da escada que estivesse disponível, de modo a não haver degraus desocupados no meio, e ficassem livres os de cima – os de maior energia). Ora, como os bosões não obedecem ao princípio de Pauli, mas apenas ao de Energia Mínima, isso implica que todos os bosões ficam no degrau do fundo, no de menor energia. Como a todos os bosões corresponde a mesma energia e estão no “mesmo sítio”, isto implica que sejam partículas indistinguíveis, pois é irrelevante chamar partícula 1 a uma dada partícula, ou chamar-lhe 2 no momento seguinte, pois isso não terá qualquer consequência na análise do sistema. (Nota: o princípio da exclusão de Pauli aplica-se, na verdade, a estados quânticos e não a estados de energia, isto é, podem haver diferentes estados quânticos com diferentes energias, o contrário é que não é válido. Um estado quântico caracteriza não só a energia de uma partícula, mas também outras características, que talvez venha a referir num artigo futuro.)
*O termo “spin”, como ele próprio indica, foi conotado com a rotação das partículas, no entanto essa descrição já não é aceite. Digamos que do mesmo modo que o modelo orbital do átomo caiu para dar lugar a um modelo mais complexo e de certo modo mais abstracto, algo semelhante aconteceu com o spin. Para não entrar em pormenores, o spin é um “número quântico” (ou seja, caracteriza o estado “quântico” de uma partícula), e só pode tomar valores discretos (esta é uma das grandes diferenças entre a física clássica, onde as grandezas são normalmente contínuas, e a física quântica onde muitas delas só tomam valores discretos) – daí que não possa ser associado a rotação. Acrescento ainda que o spin está relacionado com as interacções magnéticas (campos magnéticos afectam esta grandeza).

O Fermião

Contrariamente aos bosões, os fermiões são partículas de spin semi-inteiro (múltiplos de 1/2), obedecem à estatística de Fermi-Dirac, obedecem ao Princípio da Exclusão de Pauli e, claro, também ao Princípio da Energia Mínima.

Como o artigo já vai longo, dou por concluída a exposição. Na “Parte II″ irei falar de hadrões, leptões, muões, etc..



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December 04, 2016 at 02:03PM
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Evid��ncias refor��am a teoria do universo hologr��fico

Evid��ncias refor��am a teoria do universo hologr��fico

Dez11

Evidências reforçam a teoria do universo holográfico

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Certamente você já deve ter ouvido essa ideia de que o universo é um holograma. Basicamente, a história é a seguinte: Em 1997, o físico teórico Juan Maldacena propôs que um audacioso modelo, um universo no qual a gravidade resulta de cordas infinitesimalmente finas que vibram, podia ser reinterpretado nos termos da nossa conhecida e bem estabelecida física clássica. O matematicamente intrincado mundo das cordas, às quais existem em nove dimensões do espaço e uma do tempo, seria meramente um holograma: a real ação aconteceria num cosmos mais simples e mais chato onde não há gravidade.

A ideia de Maldacena empolgou pesquisadores porque oferecia uma maneira de colocar a popular, mas ainda desprovida de evidências, teoria das cordas num caminho sólido – e porque resolvia aparentes inconsistências entre a física quântica e a teoria gravitacional do Einstein. A ideia forneceu aos físicos uma pedra fundamental matemática, uma “dualidade” que permitia a eles traduzirem entre as duas linguagens e resolver problemas em um modelo que pareciam intratáveis no outro e vice-versa. Mas apesar da ideia ser válida, uma evidência mais rigorosa ainda faltava,

Em dois artigos publicados no repositório arXiv, Yoshifumi Hyakutake, da Ibaraki University no Japão e seus colegas forneceram, se não provas concretas, pelo menos evidências fortes de que a conjectura de Maldacena é verdadeira.

holographicuniverseNum dos artigos, Hyakutake computa a energia interna de um buraco negro, a posição do seu horizonte de eventos (sua “borda”), sua entropia (a “desordem” do sistema) e outras propriedades baseadas nas predições da teoria das cordas assim como os efeitos das assim chamadas partículas virtuais (que continuamente surgem e somem da existência). No outro, ele e seus colaboradores calcularam a energia interna correspondente ao cosmos dimensional inferior sem gravidade. Os dois cálculos bateram.

“Aparentemente, o cálculo é correto”, diz Maldacena, que atualmente está no Institute for Advanced Study, em Princeton, Nova Jersey (e que não teve colaboração no trabalho da equipe).

A descoberta “é uma maneira interessante de testar muitas ideias na gravidade quântica e teoria das cordas”, Maldacena acrescenta. Os dois artigos, ele comenta, culminam de uma série de artigos da equipe japonesa ao longo dos últimos anos. “Toda a sequência de artigos é muito boa porque testa a natureza dualista do universo em regimes onde não há testes analíticos.”

000AF072-4891-1F0A-97AE80A84189EEDF_p61“Eles confirmaram numericamente, talvez pela primeira vez, algo que certamente deve ser verdade, mas era ainda uma conjectura – no caso, que a termodinâmica de certos buracos negros pode ser reproduzida a partir de um universo dimensionalmente inferior”, diz Leonard Susskind, físico teórico da Universidade de Stanford que esteve entre os primeiros teóricos a explorar a ideia de universos holográficos.

“Nenhum dos modelos de universo explorados pela equipe japonesa parece o nosso”, comenta Maldacena. O cosmos com um buraco negro possui 10 dimensões, com 8 delas formando uma esfera octadimensional. A dimensão inferior, livre de gravidade possui apenas uma única dimensão, e o zoológico de partículas quânticas lembra um grupo de springs idealizados, ou osciladores harmônicos, anexados um ao outro.

No entanto, diz Maldacena, a prova numérica que estes mundos distintos são na verdade idênticos nos dá esperança de que as propriedades gravitacionais do nosso universo possam um dia ser explicados por um cosmos simples puramente em termos de teoria quântica.

 

Fonte:
Nature

Artigos Originais:
Yoshifumi Hyakutake. Quantum Near Horizon Geometry of Black 0-Brane
Masanori Hanadaabc, Yoshifumi Hyakutaked, Goro Ishikia3 e Jun Nishimuraef. Holographic description of quantum black hole on a computer.

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December 04, 2016 at 02:03PM
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Gravidade Qu��ntica

Gravidade Qu��ntica

Ago27

Gravidade Quântica

Em Fevereiro de 2009, o Telescópio Fermi parecia estar a recolher dados que confirmam as previsões de algumas teorias de gravidade quântica.

Estas teorias, como por exemplo a Teoria das Cordas, tentam conciliar a Teoria da Relatividade Geral, que descreve a relação íntima entre a gravidade e a forma do espaço-tempo, com a Mecânica Quântica, que descreve os fenómenos a escalas atómicas e sub-atómicas. A construção e validação de uma teoria da gravidade quântica é talvez o maior desafio actual da física. Por outro lado, testar as previsões das propostas actuais é complicado para dizer o mínimo. As energias a partir das quais os efeitos das mesmas se começam a manifestar são inatingíveis nos laboratórios terrestres, com a possível excepção do LHC quando entrar em funcionamento pleno.

Segundo estas teorias, a gravidade, a mais fraca das quatro forças fundamentais conhecidas (gravidade, electromagnética, nuclear fraca e nuclear forte) da escala cósmica à sub-atómica, torna-se a força dominante para escalas muito pequenas, próximas do chamado comprimento de Planck (cerca de 10^-35 metros !). A esta escala o espaço-tempo não é plano e regular mas tem uma topologia complicada e altamente dinâmica, com pares de partícula-antipartícula a aparecerem e desaparecerem quase instantâneamente. Devido precisamente a este aspecto do espaço-tempo, algumas versões da gravidade quântica prevêm que a velocidade da luz diminui muito ligeiramente à medida que a energia dos fotões aumenta. Aparentemente, os fotões de muito alta energia “sentem” a turbulência do espaço-tempo. Este efeito não é mensurável em laboratórios terrestres mas aqui entra em cena o telescópio Fermi.
A observação de raios gama de energias variadas provenientes de explosões de raios gama (GRBs) muito distantes permitiu detectar, até agora claramente apenas em dois casos, um atraso dos fotões de mais alta energia relativamente aos de menor energia que é consistente com as previsões de que os fotões de energias mais elevadas viajam mais devagar. No entanto, com tão poucas observações, não está posta de parte a hipótese do atraso ser devido a outro mecanismo, por exemplo, raios gama de diferentes energias serem gerados em momentos diferentes na evolução do GRB.
Para determinar qual das explicações é válida é necessário observar um grande número de GRBs ao longo de meses ou anos. Se o atraso observado aumentar com a distância dos GRBs onde são originados os raios gama então o efeito deverá ser a primeira demonstração da gravidade quântica, um feito notável! Se os atrasos não apresentarem nenhuma correlação apreciável com a distância, então outra causa estará por detrás do efeito.

Note-se que, há uns anos, a primeira demonstração (indirecta) da existência de ondas gravitacionais pela observação de pulsares valeu um prémio Nobel. No caso da primeira demonstração de um efeito da gravidade quântica o caso não seria para menos.

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December 04, 2016 at 02:02PM
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Introdu����o �� Mec��nica Qu��ntica

Introdu����o �� Mec��nica Qu��ntica

Fev26

Introdução à Mecânica Quântica

A mecânica quântica é a teoria cientifica que explica o comportamento de sistemas abaixo do nível do átomo. É uma parte do modelo padrão, a síntese de teorias para explicar o universo em pequena escala. O nome quanta, vem de pacote, porque as trocas de energia vêm em múltiplos de uma quantidade mínima, como se viessem em pacotes e não como se fossem algo continuo.

De resto o modelo padrão explica tudo como vindo em unidades mínimas discretas. O espaço, a matéria e a energia. O modelo padrão, que é o modelo que integra a mecânica quântica não explica a gravidade. Tudo o resto é descrito como trocas de partículas (mas prevê que exista uma particula para transportar a gravidade). Para alem dos “pacotes” em que é definida a energia, a mecânica quântica rompe com as teorias anteriores no seu tipo de formulação e previsões. Tudo é explicado em termos de probabilidades. Isto terá levado Einstein a formular a famosa frase “Deus não joga aos dados”. Tudo bem. A mecânica quântica usa unidades discretas para descrever a energia, usa partículas para descrever a matéria sub-atómica e as forças, então naturalmente vamos ter de ter um abordagem estatística para coisas tão difíceis de medir.

Mas aqui é que as coisas deixam de se parecer com o universo de dimensões maiores que o átomo. As probabilidades quânticas interferem umas com as outras. E a probabilidade de uma partícula ter determinada propriedades, só passa a propriedade real quando a medimos. Ainda há mais coisas contra-intuitivas, mas comecemos por estas duas. No mundo à escala da nossa visão, por exemplo, a probabilidade de o dado dar o numero 6 num lançamento, não influencia a probabilidade do dado dar 6 outra vez no lançamento seguinte. Intuitivamente consideramos que sair 6 outra vez é menor. Mas sabemos pela experiência sistemática e pela matemática que isso é errado. São acontecimentos independentes e esse erro vulgar tem o nome de “falácia do jogador”. Isto é algo que penso que apesar do nome que tem, jogadores especializados ou ratos de casino conhecem perfeitamente. No entanto em mecânica quântica não. O resultado de um evento aparentemente independente afecta directamente outro igual que apenas difira no tempo. É como se a probabilidade de sair um 6 no dado de uma vez, influenciasse algo na segunda vez que lançamos o dado. Como se algo no universo tivesse mudado por ter saído já o 6 uma vez.

Na mecânica quântica acontecimentos supostamente independentes comportam-se como sendo interdependentes.  Historicamente, debateu-se com uma situação deste género logo nos princípios da formulação da teoria:

Se lançarmos um electrão de cada vez através de duas ranhuras numa chapa, ora por uma, ora por outra, eles vão marcar num receptor um padrão de ondas como se tivessem sido todos lançados ao mesmo tempo. A cada lançamento só detectamos um electrão no receptor – embora estejamos a disparar um de cada vez, parece que disparamos todos ao mesmo tempo ao avaliarmos o resultado final. Eles interferiram uns com os outros tal como era de esperar se em vez de partículas discretas estivéssemos a fazer ondas. Mas quando acertam no receptor, podemos confirmar que chegou um de cada vez. Isto não tem paralelo no mundo macroscópico. E parece que de facto o electrão só passou a ser um quando foi medido pelo receptor. E só nessa altura definiu a sua posição. Antes era… Uma onda de probabilidades.

Richard Feynman reformulou a teoria de modo a explicar o padrão de interferência como sendo a interferência entre si de todos os caminhos possíveis que uma partícula toma de uma fonte ao seu destino. Isto resolve o facto de um acontecimento aparentemente independente interferir com outro, mas não resolve a questão similar da escolha do caminho da partícula ser influenciada retroactivamente pela nossa observação. De facto, se escolhermos observar a partícula num dado ponto, em uma das suas possíveis trajectórias, parece que tal observação irá influenciar o percurso que a partícula fez até essa medição, porque reduz o numero de trajectórias possíveis ao eliminar as que ficam fora do ponto de verificação. No mundo macroscópico a probabilidade aparece quando existem demasiados factores a contabilizar para que possamos dizer exactamente o resultado de um acontecimento. Como por exemplo dizer que numero vai sair na roleta. Seria possível se tivéssemos acesso a uma descrição perfeita da velocidade, desenho da roleta com todas as imprecisões, peso da bola, perfeição da bola, etc. Com uma super maquina e super medições seria possível. No mundo quântico não. A probabilidade é o que as coisas são. E o resultado só se forma no “momento da verdade”. É algo intrínseco. De resto sabemos, por previsão da teoria, que não podemos saber simultaneamente a velocidade e a posição de uma partícula. E ao contrário do que muitas vezes vem escrito em textos simples como este, não é apenas por uma questão de tecnologia. Não há mesmo maneira de medir velocidade e posição simultaneamente, porque só ao medirmos é que essas características se revelam, e ao medir uma, estamos a perder a hipótese de medir a outra, porque não havia antes de medir e depois de medir já a modificamos. A teoria prevê, como disse, que as coisas só são o que são quando medimos. De resto, esta característica foi algo que levou a uma grande contestação da teoria. Einstein dizia que as características tinham de estar lá, que nós é que não conseguíamos medir. Mas a teoria previa que não. Que as características não estavam definidas – estavam na tal nuvem de probabilidades quânticas – até nós as medirmos.

Como tinha prometido, ainda há outra coisa bastante incrível acerca da mecânica quântica. A não-localidade. Os efeitos quânticos não dependem da distancia. É como se para coisas abaixo do tamanho do átomo, o local onde estão seja pouco importante e possam agir à distancia como se já estivessem no destino. Em certas condições claro. Einstein chamou-lhe “Spooky action at a distance” ou em português “acção fantasmagórica à distancia”. E mais, disse que se tal fosse possível, então podíamos emparelhar duas partículas e separa-las centenas de metros que o resultado de uma influenciaria instantaneamente e mais rápido que a luz o resultado da outra.

Emparelhamento de partículas é algo difícil de conseguir mas na pratica é dar a duas partículas propriedades complementares. Como a mecânica quântica diz que a propriedade só é definida com a medição e se uma partícula não transmite à outra que foi medida, então quando medimos uma a outra tem de ficar exactamente e instantaneamente com o valor complementar. Instantâneo quer dizer mesmo ao mesmo tempo. Literalmente. Se demorar o tempo que a luz demora a percorrer esse espaço podemos suspeitar de uma partícula transmissora. Mas não é isso que a teoria prevê. E Einstein compreendeu isso e disse: “vejam só o que a vossa teoria prevê. Se isso fosse verdade tínhamos “spooky action at a distance”. Pois é. Mas hoje essa experiência foi feita inúmeras vezes e acontece tal qual como Einstein considerou impossível que acontecesse.

De resto, a mecânica quântica, mantém até aos dias de hoje a incompatibilidade com a teoria da relatividade geral, já que a maioria dos fisicos parece concordar que não havendo transmissão de informação não há razão para considerar que a velocidade da Luz é ultrapassada e logo não quebra a relatividade restrita. Não é apenas uma coisa de uma descrever o grande e outra o pequeno. Nos pontos de intersecção a conjunção das duas teorias dá resultados absurdos. Já para não falar que elas dizem coisas diferentes acerca da gravidade. Uma prevê que a gravidade seja uma partícula, a outra diz que a gravidade é a distorção do espaço. De facto uma destas teorias vai cair. E a mecânica quântica tem acertado tantas previsões incríveis e permitido tantos avanços científicos que a maior parte dos teóricos considera que será a relatividade de Einstein a cair.

Uma das mais fortes pretendentes, a Teoria das Cordas, substitui as duas de uma só vez. Mas a teoria das cordas ainda tem muitos buracos para tapar além de ser difícil testar algumas das suas previsões especificas. E tem uma coisa que a generalidade dos físicos parece não gostar. Precisa de 11 dimensões (já foram 22) para descrever o universo. São muitas dimensões que não são previstas por mais nada, não são observadas e para trazer mais 7 dimensões que as que se conhecem é preciso evidencias fortes. As entidades não devem ser replicadas para além do necessário. Mas voltando à mecânica quântica, há algo que é preciso esclarecer. Apesar de haver algumas maneiras diferentes de interpretar a matemática da mecânica quântica, os fenómenos quânticos estão longe de acontecer em dimensões maiores. Mesmo ao nível de moléculas as coisas já se passam de outra maneira.

Aquelas teorias de terapias alternativas ou místicas do universo que alegam que se baseiam na mecânica quântica, não têm nada a ver com isto. Não são ciência. São aproveitamos da ignorância das pessoas acerca de uma teoria que é tudo menos simples. O facto de os próprios físicos debaterem como devem ser interpretadas determinadas coisas não quer dizer que cada um tem o direito de dizer que a teoria faz isto ou aquilo. Por exemplo. A descoerencia é o nome que se dá ao fenómeno da partícula revelar o que é quando é medida. Os físicos consideram que o acto de medir é na realidade qualquer coisa que obrigue a partícula a revelar as suas propriedades. Ela não esta definida até que interaja com algo que a leve a dar um valor. E esse valor sai com a probabilidade que a teoria lhe atribuiu. Isto é uma interpretação. A dos “many-worlds” é outra. São interpretações, não afectam o sistema matemático da teoria. E são fundamentadas cientificamente. Mais a primeira que a segunda se me perguntarem, nas eu não tenho de dar opiniões sobre isto. Mas posso dizer que extrapolações como as que faz o Deepak Chopra são tretas. Não têm nada a ver com ciência. Nem com a parte matemática, nem como interpretações.

Por exemplo, não se conseguem actualmente emparelhar moleculas grandes e complexas (1) e objectos macroscópicos . Porque elas depois de emparelhadas precisavam de não interagir com mais nada para não se dar o processo de descoerencia, perdendo nesse instante o estado quântico de indeterminação e emparelhamento. E depois, não há maneira de fazer uma coisa a uma macromolécula aqui, de modo a que outra faça o que a gente quer ali. A informação não viaja de um lado para o outro. Nem hoje, nem provavelmente nunca. Estamos limitados pela dimensão que os objectos emparelhados podem ter e pela natureza do fenómeno. E na natureza também.  Não podemos esperar ter moléculas emparelhadas pelo corpo a torto e a direito, só porque pode existir emparelhamento de partículas. Era como julgar que o carro velho de 10 anos vira novo só porque podem existir carros novos.

Este texto já está demasiado longo. Mas tinha de ser. A mecânica quântica é muito complicada. Eu só acredito que tenha um grau de verdade elevado porque anos após anos aquilo, aquela coisa, acerta em todas as previsões e mais alguma, por mais estranha que pareça. E mais. Proporcionou um campo de investigação prolifero como poucas outras teorias. E encaixou perfeitamente com outras teorias físicas para formar o Modelo Padrão.

Notas:

Modificado dia 27: Alterações estéticas, gramaticais e corrigidos os erros apontados pelo Pedro Seixas nos comentários

(1) Foi conseguido o emparelhamento de cristais de diamante que são realmente apenas macromoleculas de carbono, cada diamante é uma unica molecula. O que foi emparelhado foram as suas vibrações. De resto o emparelhamento é dificil e o maior que se consegue rotineiramente é emparelhar iões. Em teoria tudo poderia ser emparelhado se não interagisse com mais nada. Ler mais aqui: http://ift.tt/2fZTi9i e aqui: http://ift.tt/2gVsLP3

De resto recomendo a leitura do livro ” O Tecido do Cosmos” do Brian Green para saber mais.

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December 04, 2016 at 02:01PM
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